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Baú Cultural com Lucivânio Jatobá

O Baú Cultural traz um tema muito importante debatido no auditório da Livraria Cultura pelo geógrafo pernambucano Lucivânio Jatobá: Eventos climáticos na porção oriental do Nordeste brasileiro e a análise geográfica.. A palestra foi organizada pelo professor universitário Gilberto Rodrigues o qual coordena a Fundação Gaia - www.ciclogaia.com -  que traz a ideia de promover alterações no modo de olharmos o planeta Terra.


A Fundação Gaia promove palestras todos os meses na Livraria Cultura.


O Palestrante


 
Lucivânio Jatobá, no auditório da Livraria Cultura



Convidado para ministrar a palestra organizada pela Fundação Gaia, Lucivânio Jatobá nasceu em Pesqueira, PE. Mestre em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Ensina nessa universidade desde 1977. Atualmente, ele é professor adjunto do curso de ciências ambientais da UFPE. Com vasta experiência acadêmica, o geógrafo pernambucano lecionou em inúmeras universidades, dentre as quais se destacam a Universidade Católica de Pernambuco - UNICAP e a Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB. Escreveu vários livros na área de Geomorfologia e Metodologia do Ensino da Geografia.

A Palestra

Inicialmente, Lucivânio Jatobá apresentou algumas fotos que mostravam a destruição ocasionada pelas cheias ocorridas na Zona da Mata Sul de Pernambuco, em algumas regiões de Alagoas e na Paraíba, em menor escala. Em uma foto, havia um cachorro no telhado de uma casa quase que submersa pela água do rio. Lucivânio chamou atenção para a solidão do animal que aguardava socorro. Aquela imagem representava, simbolicamente, o sofrimento, não só do animal, mais de seres humanos castigados por um evento climático.

Uma análise geográfica

O palestrante explicou o surgimento dos eventos climáticos. Segundo ele, tudo se inicia numa relação dialética entre o Sol e a Terra. O Sol emite uma grande quantidade de energia que é chamada de radiação de ondas curtas - ROC. Ela é transmitida pelo espaço e atravessa a atmosfera terrestre sem aquecer o ar. Uma parte dessa radiação é refletida pelas massas polares e nuvens, enquanto que outra parte é absorvida pelas massas continentais e pelos oceanos os quais transformam a ROC em ROL - radiação de ondas longas. A partir desse momento, todo dinamismo atmosférico terrestre é determinado pela atuação da ROL. 
Se ocorrer qualquer transformação na relação Sol-Terra, por menor que seja, haverá alterações climáticas de curta duração, diga-se meses e anos, ou de longa duração, diga-se séculos ou milênios.
Lucivânio citou um acontecimento ocorrido na Terra há 18000 mil anos no qual o nosso planeta se resfriou vertiginosamente. Deduz-se que alguma alteração no conjunto Terra-Sol provocou esse período de glaciação.
Ao contrário desse fenômeno milenar, há alterações de curto período, chamados pelo geógrafo de decadais. Um exemplo significativo foi as enchentes ocorridas na porção oriental do Nordeste.


Sistemas Atmosféricos atuantes no Nordeste


A ZCIT compreende essa faixa branca na Linha do Equador


Lucivânio explicou a atuação da Zona de Convergência Intertropical no Nordeste brasileiro, conhecida pela sigla ZCIT. A ZCIT é formada numa área de baixas pressões, região onde encontramos a linha do Equador. Por ser uma área de baixas pressões, há uma tendência dos fluxos de vento migrarem para a ZCIT. As origens dos fluxos são o Hemisfério Norte e o Hemisfério Sul. No Norte, os ventos são formados numa área de altas pressões, mais especificamente, nas proximidades das Ilhas dos Açores. Esses ventos são chamados de Alísios de Nordeste. Por outro lado, os ventos oriundos do Sul, são os Alísios de Sudeste, formados nas proximidades da Ilha de Santa Helena. Esses ventos migram em direção à Linha do Equador, região caracterizada pela formação de nuvens altamente desenvolvidas no sentido vertical e, consequentemente, geradoras de grande volume de chuvas.
Lucivânio utilizou duas palavras empregadas na área biológica que foram a sístole e a diástole. Segundo ele, os centros de alta pressão têm a propriedade de sofrerem sístole (contração) ou diástole (expansão), dependendo da estação climática. Por exemplo, durante o verão, os ventos Alísios de Sudeste ficam restritos ao local de origem, entretanto, durante o inverno, há uma expansão desses ventos para diferentes regiões, dentre as quais o Nordeste brasileiro.

O que provocou as últimas chuvas?

Ondas de Leste


O oceano Atlântico fica muitas vezes resfriado. A partir daí, surge uma zona de alta pressão, propagadora de ventos para a ZCIT. A característica dessa zona é a sua energia. Os ventos adquirem uma velocidade tão grande que "jogam" a ZCIT mais para o Norte. Logo, não haverá chuvas no Estado da Paraíba, do Rio Grande do Norte, de Pernambuco, dentre outros.
Porém, não foi o que aconteceu no ano de 2010. O oceano Atlântico presenciou uma anomalia térmica, provocando um aquecimento exagerado nas águas do Sul. Sendo assim, surgiu uma zona de baixa pressão, sem poder de "jogar" a ZCIT para o Norte. Logicamente, a ZCIT migrou para o Sul, trazendo consigo todas as características geradoras de chuvas torrenciais para a porção oriental do NE. Além disso, pelo aquecimento das águas atlânticas, há a formação de um novo evento climático. São as Ondas de Leste. 
Com a junção da ZCIT mais ao Sul e as Ondas de Leste na Zona da Mata choveu durante seis dias seguidos, alternando ZCIT e Ondas de Leste com suas características.

Fenômenos que poderão causar novas chuvas no Nordeste

Frente Polar Atlântica

Um fenômeno típico dos meses de inverno é o encontro de um ar polar com um ar tropical. Esse evento é chamado de Zona de Convergência do Atlântico Sul ou Frente Polar Atlântica. Comum nos meses de Junho e Julho, o ar polar prevalece, pois devido ao inverno, há uma diástole da massa de ar polar. 

Perguntas da platéia

Como poderíamos, através da análise geográfica e climatológica, obter ajudar do poder público para amenizar os efeitos de chuvas como as que ocorreram?
LJ: Em primeiro lugar, deve-se fazer em caráter emergencial o represamento das águas. Então, o governo sinaliza no sentido de construir barragens. De forma prática podemos citar o exemplo da construção de barragens durante o governo militar. Com isso, enchentes que ocorreram na década de 70, não ocorrem mais.

Uma espectadora complementou a importância da conscientização da população quanto ao risco de desastres e da prevenção. Além disso, é necessário utilizar a Defesa Civil que segundo ela não existe em sua cidade - uma das atingidas pelas fortes chuvas.

Como os cidadãos comuns podem se informar sobre os eventos climáticos. Existe algum site específico?
LJ: Qualquer pessoa pode, através do site do INPE e do INMET, conferir o que acontece com a atmosfera terrestre. Basta efetuar uma animação no próprio site e, analisar o acontece em tempo real na atmosfera.  


Uma interpretação das opiniões de Lucivânio Jatobá

Percebe-se uma desordenação no espaço urbano das cidades atingidas pelas últimas chuvas. A urbanização foi feita sem respeitar o curso fluvial e sem projetar as possíveis extrapolações do nível de água das bacias hidrográficas. Além disso, nota-se a construção de milhares de casas nas margens do rio, o que indica a destruição das matas ciliares as quais representam uma importante vegetação auxiliadora na absorção da água e na conservação dos rios.

Minhas considerações

Ao término da palestra, percebi a importância da análise geográfica na compreensão dos eventos climáticos ocorridos na Zona da Mata Sul de PE e em outros estados do Nordeste. A cooperação entre ciência e poder é de extrema importância na prevenção de catástrofes ocasionadas pelas enchentes. O Estado tem a obrigação de instruir a população, através da educação ambiental, como se comportar nessas situações. Além disso, deve-se utilizar a tecnologia para auxiliar a população na prevenção dos desastres.


Fotos da Palestra

Lucivânio Jatobá explicando os fenômenos climáticos
 
Platéia na Livraria Cultura


Comentários

  1. Com certeza, uma palestra a que todos deveriam ter assistido.
    Obrigado e parabéns Mateus pelo trabalho e qualidade dele.
    Abraço.
    (Pedro)

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  2. Lamento que essa palestra não tenha sido divulgada com mais abrangência.
    Agradeço sua parabenização.
    Forte abraço, do seu amigo Mateus.

    ResponderExcluir
  3. Jatobá....professor maravilhoso!Lembro-me bem dos desenhos geográficos de cada aula....é fera demais ele!!!

    ResponderExcluir
  4. Nunca estudei com ele, mas gostaria muito. Seus livros demonstram o profissionalismo. Muito bom!

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  5. Professor Jatobá!!...saudades de suas aulas....um dos melhores professores que já tive..parabéns

    Ingrid da S. Fernandes

    ResponderExcluir

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